
Por IDMJR
A Iniciativa Direito à Memória e Justiça Racial não busca produzir dados para torna-se uma organização de pesquisa no debate de violência do Estado, nem apenas como objetivo de “melhorar a política pública de segurança pública do Estado” – como a branquitude insistentemente declara. Nossa intencionalidade é a produção conhecimentos, diagnósticos e dados exclusivamente para munir nossa atuação política e ajudar na emancipação social. Nosso objetivo é mudar uma realidade tacanha e assassina. Atuamos politicamente para transformar a vida da população favelada e periférica.
Produzimos dados para re(afirmar) que somos sujeitos construtores de conhecimento e de distintas epistemologias. Ressaltamos que os dados oficiais são os que o nosso próprio povo produz sobre a realidade cotidiana que vivenciam. Os dados estatais ou a ausência dados, as subnotificações, servem para proteger o próprio projeto deste Estado genocida e racista. Afinal, a política pública da ausência, da falta, do não contabilizado também é uma política pública e faz parte do projeto político de produção de morte deste Estado.
Não precisamos que as universidades e outros organismos privados ou públicos para validar ou legitimar o que produzimos, entendemos que a produção de conhecimento que tratamos é construída por seus próprios protagonistas e não precisa de porta-vozes da branquitude. Construimos ciência e nossa legitimidade advém do cotidiano de violações do povo preto e pobre da Baixada Fluminense.
Nossos dados prioritariamente são produzidos para e com a nossa população preta e/ou pobre para gerar denúncias, visibilidade, indignação e revolta. Sobretudo, para estimular movimentos insurgentes e que sejam capazes de produzirem enfrentamento à quem nos executa e encarcera, o Estado – nosso inimigo público!
Nossos dados são nossas memórias de dores. Mas, também das resistências e para lembrar aos nossos e as nossas que o projeto de liberdade ainda não aconteceu, sem nenhuma dúvida: está em curso!
Inclusive, nem tudo que produzimos é publicizado. Por questão de proteção, dadas algumas circunstâncias, optamos por não tornar público uma série de arbitrariedades. Contudo, todas essas informações são utilizadas para munir nossa atuação política e transformada em algum tipo de controle social. Ademais, todas as informações são compartilhadas com os territórios para pensar estratégias de sobrevivência, resistência e subversão. Nosso comprometimento é com a luta social, com favelas e periferias.
Defendemos a necessidade de construção de projetos de sociedade, como a Hidra de Iguassú, um complexo quilombola que fundou a região da Baixada Fluminense e resistiu durante 100 anos aos intentos da Guarda Real da Coroa Portuguesa, na época foi considerada o maior problema de segurança pública do Estado. A partir das experiências de proteção, cuidado e autodefesa ancestrais dos povos originários e do povo negro, compreendemos o nosso papel político de produção de estratégias de sobrevivência, seja no enfrentamento ao braço armado do Estado, na construção de indicadores sobre violência policial, informes de operações policiais no território, denúncias internacionais de violações de estado, desaparecimentos forçosos e dispositivos de proteção contra violência de gênero.
Assim como as mães e mulheres negras de favelas e periferias, que cuidam de seus filhos e dos filhos de toda a comunidade, alertam quando o Caveirão sobe becos e vielas, alimentam seus iguais com o que têm dentro de seus armários, estão prontas para tomar partido em defesa dos seus e buscam de forma intransigente a defesa e garantia da vida dos seus e suas.Nossa produção de conhecimento é para instrumentalizar rotas alternativas de circulação e de sobrevivência.
Precisamos cuidar dos nossos dados, como awos – segredos de sobrevivência. Não vamos compartilhar todos os nuances e complexidades – como a branquitude está sedenta pra saber. Nossa produção e conhecimento sempre estará à serviço de um projeto político coletivo, autônomo, periférico e preto. Nossa legitimidade, expertise e validação vem do chão das favelas, dos becos das periferias, do barro do campo e da indignação daqueles que estão do lado de fora dos jantares da elite econômica deste país.
Teoria com prática pra enfrentar a miséria, o racismo, a colonização e o patriarcado em um modo de produção de vida capitalista e acima de tudo sanguinário. Porém, superável. Alimentemos nossa indignação para derrubar esse sistema, nas cinzas da dissolução deste Estado ver surgir a esperança da emancipação do povo negro. Todo poder ao povo negro!