0 6 min 3 anos

Por Equipe IDMJR


O sistema colonial deixou um rastro de extermínio de povos originários, escravização, pilhagem, expulsões, expropriações, doutrinação cristã, violência e espoliação por onde passou as expedições ‘civilizatórias’. A formação social brasileira foi fundada a partir do processo escravagista que teve um caráter violento na captura do povo africano viabilizado através de mecanismo de tortura, sequestro e dominação de corpos negros. 

Os ataques aos terreiros, quilombos, e território de religiões de matrizes africanas na Baixada Fluminense estão na origem do período escravocrata marcado pelo processo de tortura e genocídio e sequestro de milhões de pessoas de diferentes etnias africanas. 

Após os processos brutais de retirada de seus próprios territórios, africanos de todas as partes do continente precisaram construir novas formas de viver a vida em novos continentes. Mas, não só de violência o cotidiano desses sujeitos era feito. Um mundo de trocas e sociabilidade se construiu a partir da experiência num novo local. Formas de ver o mundo, domínio de diferentes tecnologias, ideias e crenças são exemplos destas trocas. 

Assim, a diáspora não é apenas sinônimo da imigração à força, mas também uma redefinição identitária, ou seja, a construção de novas formas de ser, agir e pensar no mundo. Inclusive seus ritos e religiões de matrizes africanas foram reinventados e transformados devido a todo processo violência racial, que precisou resistir ao colonialismo e a cristandade. Essas religiões foram criminalizadas por toda a nossa história pelo Estado, pelo simples motivo de ser resistência e cura de povos negros.

Atualmente estamos assistindo a um processo de ameaças e expulsões a Terreiros da Baixada Fluminense, passaram-se séculos mas a cultura do povo negro ainda sofre pela criminalização, repressão e violações do Estado. 

Devido a expansão do poderio da milícias e as articulações direta com frações neopentencostais do cristianismo que fazem parte do projeto político vencedor nas últimas eleições, representadas por figuras como pastores e militares. Esse projeto colonialista vem se reproduzindo e gerando espaços de privilégios/opressão até dentro do sistema prisional quando milicianos e membros de facções articuladas com as milícias são “convertidos” ao neopentecostalismo e passam a ter uma série de acessos e domínios.  A partir dessa conversão também ocorreu uma contrapartida:  perseguição e de produção de violações e violências com relação às religiões de matrizes africanas.

Em 2019, foram registrados 132 casos de intolerância religiosa no Estado do Rio. Destes, 15 aconteceram somente em Nova Iguaçu, segundo informações da Secretaria Estadual de Desenvolvimento Social de Direitos Humanos. Em nosso levantamento realizado a partir de reportagens de jornais e redes sociais identificamos que maioria dos ataques a terreiros na Baixada ocorrem em territórios de domínio de milícias e do terceiro comando. 

Vale ressaltar que hoje há uma parceria entre esses atores em boa parte da Baixada Fluminense-RJ. Os Terreiros mais afetados ficam nos municípios de Nova Iguaçu e Duque de Caxias. Nos relatos e depoimentos das lideranças dos Terreiros e Casas, no ato das ameaças e destruição desses espaços boa parte se identificavam que eram pessoas defendendo a cristandade e repudiando qualquer tipo de religião que não comungue de pressupostos cristãos. 

A criminalização de traços culturais da cultura negra é tão brutal e estrutura toda as relações sociais desta sociedade e inclusive as relações de poder econômico e de violência urbana nos territórios favelados e periféricos. Estamos vivenciando uma ofensiva neoconservadora e cristã em todas as esferas de poder desta sociedade, inclusive no domínio do poder armado dos territórios. E os alvos destes ataques é a parcela população historicamente oprimidas: o povo negro do Axé. 

A IDMJR repudia qualquer tipo de ataque a religiões de matrizes africanas, entendemos que a expansão da milicialização também estimula um processo de racismo religioso, expulsões de terreiros, ataques e opressões ao povo de santo. Ressaltamos que está em curso aplicação de um projeto de sociedade conservador, ultraneoliberal e fascista que foi gestado no interior de governos progressista e que tem como alvo, o povo negro.


*Para denúncias sobre racismo religioso, acione o Núcleo de Atendimento às Vítimas de Intolerância Religiosa (Navir). Rua Terezinha Pinto 297, 3° andar, no Centro de Nova Iguaçu.

Deixe uma resposta