
por Nívia Raposo
Entrevista com a mãe Sandra Regina Rocha , mais uma Vítima da Violência do Estado.
Viver num país negacionista trás adoecimentos físicos, mentais e uma série de dores que podem ser invisíveis por quem não vivencia o trauma da perda. Quando pensamos o negacionismo precisamos ampliar o sentido conceitual da violência. Famílias pobres periféricas e faveladas nunca tiveram períodos sem repressões. Esse impacto é sentido desde sempre.

O abandono e a precariedade caminham lado a lado nesses territórios empobrecidos. Além da violência física, o abalo psicológico tem continuidade na medida que familiares procuram por justiça para seus entes queridos. Ao se perceberem com pouquíssimos direitos diante do inabalável Estado, o sentimento de impotência chega junto ao entendimento de sermos sujeitos desautorizados.
Lidar com certidão de nascimento do seu filho/irmão é muito diferente que lidar com certidão de óbito do mesmo. Ler e reler boletins de ocorrências, laudos de necropsias, laudos cadavéricos, para contestar as circunstâncias das mortes, é uma tarefa muito dura para os familiares que acumulam sofrimentos. A depender do caso, os jornais também não possuem sensibilidade para com essas famílias, pois, com matérias sensacionalistas, vendem mais. No fim, o capital ganha de qualquer maneira. Seja como produtora das mortes, seja noticiando-a. Sobretudo quando os casos ocorrem em favelas e periferias.
Nesse sentido, fomos perguntar para uma mãe da baixada sobre essas dores e momentos de saudade. E Sandra comenta como era a rotina do seu filho e o que muda ao ver que seu filho teve a vida interrompida de forma tão abrupta.
Qual o nome do seu filho e quantos anos ele tinha?
Jonathan Rocha de Oliveira, 26 anos.
Como era o Jonathan?
Comenta que nunca se imaginou enterrar um filho. Diz que não tem como esquecer o quanto o jovem flamenguista era risonho, amigos de todos e muito responsável com o filho. Afirma que ele não deixava faltar nada para o filhinho de apenas 6 anos.
Como ocorreu essa tragédia?
Sandra, diz que o jovem saia de casa todos os dias para trabalhar numa fábrica de salgados na Maré. Uma testemunha disse que tudo estava calmo e tranquilo, quando Jonathan passava pelo trajeto que sempre fazia. Teve sua rotina alterada com uma troca de tiros repentina na Maré, em fevereiro de 2022. Foi vítima de um tiro fatal de fuzil que tirou sua vida, sua alegria, acabou com seus sonhos e planos.
Jonathan foi mais um dentre os muitos jovens que deixam suas famílias e comunidades dilaceradas pelas dores. Sandra conta da saudade do filho, da falta que faz aos irmãos e amigos. Comenta o quanto sua filha sente saudade do irmão, pois eram muitos apegados. Sente que está cada dia mais emotiva, pois chora por tudo. Redobrou os cuidados e preocupações com os outros dois filhos.
Leva e busca a filha todos os dias na escola e não consegue ficar tranquila enquanto o filho mais velho não chegar em casa.
Sandra é mais uma mãe que hoje precisa de atendimento psicológico, que se desdobra nos cuidados e atenção a sua benção, o neto Kaue, filho de Jonathan. Sandra nos conta que tem se distraído fazendo crochê, oficio que aprendeu com sua mãe. E entre um ponto e outro, reflete sobre toda essa violência contra os jovens e o vazio que essa ausência forçada deixa em todas essas famílias.