
Por Beatriz Vidal
No dia 02 de fevereiro de 2021, o Deputado Estadual Charles Batista protocolou o Projeto de Lei 3552/2021 que dispõe sobre a CRIAÇÃO DO CADASTRO ESTADUAL DE HOMICIDAS DE AGENTES DE SEGURANÇA PÚBLICA NO ÂMBITO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS.
Para Iniciativa Direito à Memória e Justiça Racial-Baixada Fluminense RJ trata- se de mais uma ação da bancada da bala para exercer o controle dos corpos negros e/ou periféricos, além de potencializar a Milicialização da Política de Segurança Pública do Estado do RJ.
Confira o parecer construído pela nossa Assessora Jurídica, Beatriz Vidal.
Em análise sobre a Constitucionalidade ou não do presente projeto, vemos latente sua inconstitucionalidade. A Constituição Federal traz, em seu artigo 5º, inciso X, que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas”. O Código Civil, em seu artigo 21, diz que “A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma”.
Além disso, o Brasil trata do direito à privacidade no Marco Civil da Internet e na Lei Geral de Proteção de Dados.

Para além, no artigo 2º da primeira Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, estão elencados como direitos “naturais e imprescritíveis do homem”, “a liberdade, a propriedade, a segurança e a resistência à opressão”. Já em 1793, no momento em que a Revolução Francesa empreende uma guinada social, mais uma vez, em nova declaração, o direito à segurança é lembrado; 150 anos depois, a Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU repetia em seu artigo 3º: “Todo indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal”. Por seu turno, a Carta Magna de 1988 também estampa, em seu artigo 6º, a segurança como um direito fundamental.
Dessa forma, a segurança pessoal é uma variável importante a ser considerada nas discussões e estratégias de respeito aos direitos humanos. Tanto quanto a saúde, a educação e o trabalho, a segurança é um dever do Estado democrático perante seus cidadãos. Assim, ao se falar sobre a possibilidade de haver um cadastro para rotular presos de homicidas de agentes de segurança pública, vemos o direito à integridade da imagem e segurança dos indivíduos cumprindo pena, feridos constitucionalmente.
Pois, onde será resguardada a segurança dos mesmo em não haver uma retaliação? Com qual intuito senão a “vingança institucional” têm-se para a realização desse fomento?
O projeto em questão se justifica nos seguintes argumentos:
“Os servidores públicos que atuam na área de segurança pública estão mais vulneráveis aos altos índices de criminalidade que assolam a sociedade, pois convivem diariamente com o perigo representado pelos criminosos, seja nas ruas deste Estado, seja nas cadeias, delegacias e penitenciárias.
As mortes de agentes públicos no exercício de suas funções ou em razão delas não podem ser tratadas como efeito natural da política de segurança pública. A defesa dos direitos humanos se aplica indistintamente a todos.
Por este motivo, faz-se necessário identificar os criminosos homicidas de agentes de segurança pública para que se possa ter maior cautela e precaução no que pertine a segurança do agente, bem como de suas famílias.”.
A principal justificativa para o presente projeto é para se ter maior cautela e precaução pela segurança dos agentes e suas famílias. PONTO. Escrevo “ponto”, pois, não se tem nenhuma outra justificativa plausível, a referente PL não trás nenhum artigo ou lei para corroborar com os argumentos, ou falta dos mesmos. É aterrador.
Assim, tal justificativa não se mantém quando se observa que, a Constituição Federal e a Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU, bem como, a nova Lei de Abuso de Autoridade, do ex-Ministro Sérgio Moro, que traz em seu texto a impossibilidade de divulgar nome e imagem de presos e passam a ser crimes ações que até então eram consideradas infrações administrativas ou atos ilícitos punidos no âmbito cível. Um exemplo são os atos de constranger o detento a exibir seu corpo “à curiosidade pública” ou de divulgar a imagem ou nome de alguém, apontando-o como culpado”.
Os tipos penais da nova Lei de Abuso exigem dolo específico, ou seja, o agente deve praticar a ação com a finalidade de prejudicar outrem (o detido/preso), beneficiar a si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, por mero capricho ou satisfação pessoal (vaidade). Sem isso, não há crime, sequer em tese.
Quando a lei fala em “curiosidade pública”, ela faz alusão a exibição desprovida de finalidade específica ou interesse público, onde se visa, tão somente, entregar o sujeito a sanha popular de saber quem ele é e o que fez. Esse é o ponto crucial que vemos surgir como propósito para essa PL.