0 6 min 3 anos

Por Nívia Raposo e Giselle Florentino

Neste 30 de agosto, a ONU marca o Dia Internacional das Vítimas de Desaparecimentos Forçados. O desaparecimento forçado trata-se da privação de liberdade. São pessoas capturadas, presas, sequestradas, detidas ou retiradas de seus territórios contra sua própria vontade, seja pelo Estado ou por qualquer organização política, com ou sem apoio do governo. Sendo levadas para áreas desconhecidas, torturadas, mutilados e executados sem que haja vestígios ou rastros dos corpos ou qualquer evidência da autoria do crime. Os corpos são descartados em cemitérios clandestinos ou rios para impedir a identificação das vítimas.

Assistimos na Baixada Fluminense um constante aumento dos casos de desaparecimentos forçados após a ascensão e domínio das milícias nos territórios. São justamente as áreas com maior número de denúncias e depoimentos de desaparecimentos forçados controladas por  milícias que de forma arbitrária e violenta encarceram, assassinam e desaparecem com os corpos dessas pessoas. 

Ademais, a maior parcela das violações cometidas pelo Estado não chegam a ser registradas. Além da problemática das subnotificações, as metodologias utilizadas pelos órgãos oficiais não são disponibilizadas para livre acesso e os procedimentos metodológicos são alterados de acordo com os interesses do governo estadual para esconder a ineficiência da política de segurança pública.

Por isso, a luta por justiça e garantia de direito à memória de mães e familiares de vítimas de violência de Estado é tão urgente e imprescindível. São essas mulheres negras quem impedem que a memória dos seus entes queridos sejam esquecidas e principalmente constroem a luta cotidiana contra as violações do Estado para outras mulheres e mães tenham o direito de ver seus filhos, sobrinhos, afilhadas, amigos, companheiros e irmãos vivos.

É justiça que eu estou querendo, né! O que aconteceu com meu filho, espero que eles, até antes de eu morrer me dê uma resposta. Eu vou lutar até o fim da minha vida!”

(Dona Izildete)

A IDMJR fez uma entrevista com a Dona Izildete (70 anos), mãe do Fábio Santos que tinha 20 anos quando sumiu em 2003, após uma abordagem policial. Abaixo, o relato na íntegra:

 “A história sobre meu filho desaparecido foi uma data muito triste para mim, foi em 2003, no dia 9 de 2003 em Queimados. Eu tinha ido pro hospital com minha irmã, deixei meu filho Fábio tomando conta do meu filho especial, o Flávio. Quando eu cheguei na véspera as vizinhas falaram que ele tinha ido para uma Festa Junina e não tinha chegado em casa. Aí eu fiquei naquele desespero, fui procurar correr atrás, fui no lugar da tal Festa junina que era uma festa de rua, né?

Aí foi quando o colega dele que estava junto com ele, os três que estavam juntos com ele disseram que o policial tinha abordado o Fábio e o Rodrigo – o colega dele. Aí eu comecei correr atrás, fui atrás dos policiais, fui na delegacia, registrei a queixa. Mas, até hoje 2020, eu não tenho uma solução, nem do Estado e nem do governo. É uma data muito triste para mim, está fazendo 16 anos e sem resposta! 

O Estado sabe, assim como o Direitos Humanos, só que não assumem suas responsabilidades.  Eu ainda vou lutando, eu tenho que tá nessa luta porque até agora ainda não tive uma resposta da justiça. É justiça que eu estou querendo, né! O que aconteceu com meu filho, espero que eles, até antes de eu morrer me dê uma resposta. Eu vou lutar até o fim da minha vida, porque eu tô querendo uma resposta. É muito triste porque todo dia acordo, pensando de realizar meu sonho. Ter ele perto de mim ou saber qualquer resposta do Estado.

 Desde 2003 já fiz de tudo para encontrá-lo: ação na Justiça, passeatas e até escrevi uma carta para o presidente Lula. Nada adiantou, mas não vou desistir pois não deixarei que esqueçam o que aconteceu com meu garoto.”

Os dados oficiais produzidos a partir de boletins de ocorrência não mostram a realidade dos territórios predominantemente pretos e pobres: o crescimento dos casos de desaparecimentos forçados, os cemitérios clandestinos e o assassinato cotidiano da juventude negra e infelizmente essa realidade brutal continua em funcionamento em tempos de Covid-19 e suspensão de operações policiais. 


Deixe uma resposta