
Por Monique Rodrigues
“A luta da mulher negra é ancestral.”
É com essa frase que Mãe Meninazinha de Oxum começa respondendo essa entrevista. Esta afirmação é o fio condutor das lutas que atravessam a história da resistência à opressão racial no Brasil. Mulheres negras lideram as revoluções cotidianas que acontecem dentro das periferias, favelas, subúrbios e espaços coletivos diversos, que se estende por toda sociedade.

A Iniciativa Direito à Memória e Justiça Racial, conversou com Mãe Meninazinha, sobre as celebrações deste dia 25.07.2020, Dia Internacional da Mulher Negra, Latina e Caribenha, onde há 28 anos atrás, uma rede de mulheres organizou em Santo Domingos, República Dominicana, um encontro para debater pautas e ações em combate às desigualdades raciais e de gênero que colocam a mulher negra na última categorização das hierarquias sociais, definindo este lugar excludente, como metodologia para subjugar os corpos e as necessidades de mulheres negras.
Aos 82 anos, Mãe Meninazinha de Oxum é uma liderança religiosa que através do fundamento do Candomblé traça sua história e carrega a luta, de muitas e muitos, em si mesma. Nesse breve bate papo ela falou sobre temas que atravessam a ação da IDMJR.
As questões raciais que estruturam o Brasil, fundamentando as políticas de Segurança Pública e genocídio do povo negro, é a nossa principal batalha contra o Estado que determina a morte, a violência, as ausências e silenciamentos, onde tais condições estão na vida de mulheres negras e no cotidiano dos terreiros das religiões de matriz africana. O terreiro de Mãe Meninazinha fica situado em São João de Meriti, município da Baixada Fluminense que atravessa condições dramáticas de cerceamento das práticas religiosas. Assim como toda Baixada, o racismo religioso espalha um lastro assustador de intolerância e ameaça.
“Infelizmente apesar da luta o racismo nos trouxe grandes perdas, muitas vezes perdemos importantes espaços pela ignorância de muitos. Nosso ganho é ver nossos jovens dentro da Universidades lutando por igualdade, hoje vemos um genocídio dos nossos jovens negros, das mulheres negras, isso é um retrocesso da nossa luta ancestral.”
Essa luta ancestral tão bem apresentada por Mãe Meninazinha está no foco dos debates atuais, o que nos possibilita afirmar que o Estado Brasileiro, agente principal de violações, tem uma dívida histórica com essas populações no que tange às políticas de reparação, mas também, na produção de justiça racial.
A IDMJR compreende a Justiça Racial como ação coletiva de erradicação das desigualdades raciais, sociais e de gênero, enfrentamento às políticas genocidas do Estado e a luta constante pelo fim das hierarquias capitalistas. A construção desta Justiça está colocada pelos movimentos sociais de resistência, por isso este dia 25.07.2020 é tão significativo para mulheres negras. Os marcos simbólicos produzidos por esses grupos pretos, periféricos e oprimidos, insere rupturas que geram mudanças e modificam a naturalização pré estabelecida pela supremacia branca, e suas políticas de dominação.

“Infelizmente apesar da luta o racismo nos trouxe grandes perdas, muitas vezes perdemos importantes espaços pela ignorância de muitos. Nosso ganho é ver nossos jovens dentro da Universidades lutando por igualdade, hoje vemos um genocídio dos nossos jovens negros, das mulheres negras, isso é um retrocesso da nossa luta ancestral.” (Mãe Menininha de Oxum)
Nos debates que perpassam as reivindicações de grupos, coletivos, movimentos e organizações negras na Baixada Fluminense, as urgências que estão colocadas são, quase sempre, o constante extermínio que esse território sofre. A IDMJR acompanha e sistematiza dados específicos da baixada, compreendendo seus 13 municípios, e esses indicativos são alarmantes. O impacto na vida das mulheres negras é imediato, sendo mães, companheiras, filhas, entre tantas relações de afeto, elas assumem a função do cuidado constante. No último mês a incidência jurídica por meio da ADPF 635 foi decisiva na construção de enfrentamento à violência policial, sistematizadas por meio das operações, que durante esse período de pandemia e teórico isolamento social, torna-se a atual política de genocídio.
“O bandido está em todos os lugares não só nas comunidades e periferia, o que nos impacta é o número de famílias que ficam vulneráveis em algumas situações.”
Mulheres negras estão comprometidas desde sempre na ação de enfrentamento, esse dia 25.07, onde Latino Americana e Caribenhas celebram o marco histórico de 1992, inúmeras brasileiras estão nas periferias, subúrbios e favelas reinventando e estabelecendo a resistência revolucionária. Muitas delas em uma luta solitária.
“Os Homens têm mães,filhas, irmãs, muitas mulheres em suas famílias, então acho fundamental essa defesa deles em favor das mulheres.”
Mãe Meninazinha de Oxum
O espaço do terreiro mostra como as vivências e enfrentamentos, são interligados, e jogando luz à um debate importantíssimo, Mãe Meninazinha reflete a importância da presença dos homens aliando-se nas lutas contra as opressões. Analisando a estrutura histórica percebemos que são as mulheres negras as principais agentes de enfrentamento às violações e transformação no processo das realidades, e por outro lado, homens negros são as vítimas diretas. O estado de vulnerabilidade de mulheres negras se configura por dois lados, na ação externa e no sentido da vida privada.
“Os Homens têm mães, filhas, irmãs, muitas mulheres em suas famílias, então acho fundamental essa defesa deles em favor das mulheres.”
A Justiça Racial é o caminho traçado nos enfrentamentos históricos onde o povo negro se levanta e de inúmeras maneiras e produz a denúncia necessária contra a violência de Estado. O Dia Internacional da Mulher Negra, Latina e Caribenha mostra um momento de organização e insurreição coletiva, para a transformação social que vem das bases, porque se mulheres negras formam as bases sociais, somos nós que abalamos as estrutura pré estabelecida.
“Mãe Meninazinha de Oxum na sua sabedoria infinita aponta: Igualdade. Equidade. Respeito. Paridade. Humanidade e por ai…”
Mães de Santo, as detentoras da energia ancestral fazem parte de um grupo que está na linha de frente do embate contra o racismo, a violência de Estado e a exclusão de negros na sociedade brasileira.