0 8 min 4 anos

Por Fransérgio Goulart, Joel Luiz e Giselle Florentino


O deputado federal pelo estado de São Paulo Daniel Silveira protocolou o Projeto de Lei 3019/2020, pedindo que grupos antifascistas, que começaram a sair em manifestação no último final de semana, contra o presidente Jair Bolsonaro, sejam classificados como terroristas e enquadrados na Lei Antiterrorismo, a lei 13.260/2016. 

Vale ressaltar que a Lei Antiterrorista foi criada durante os anos de Governo PT, um dispositivo jurídico que dá margem para a criminalização de movimentos sociais. Logo, por mais que a gestão do Estado esteja nas mãos dos ditos progressistas, isso não impediu que houvessem processos de criminalização aos grupos políticos não partidários. 

A tentativa de alteração da Lei Antiterrorista por parte do PL 3019/2020, possui uma direta ligação com a também proposta do Presidente dos EUA, Donald Trump, ao enquadrar os grupos antifascistas como terroristas.

 “Os Estados Unidos da América designarão o ANTIFA como organização terrorista”, Trump afirma que os grupos antifascistas estão por trás dos atos contra a morte de George Floyd.

Portanto, precisamos compreender do que se trata o conceito de terrorismo, sendo uma definição que foi criada no contexto pós Guerra Fria. O doutrinador Valerio de Oliveira Mazzuoli, destaca o terrorismo, como atos violentos de uma pessoa ou grupo, que geram surpresa ou terror, por sua principal característica ser a imprevisibilidade.

“Por terrorismo se entendem os atos violentos de uma pessoa ou de um grupo de pessoas, praticados de surpresa e geradores de terror, contra pessoas inocentes ou alvos normalmente sem interesse militar, voltados à demonstração de insatisfação para com os poderes constituídos, a fim de modificar ou substituir por outro o regime político existente. Pode também ser praticado para chamar a atenção da opinião pública sobre determinado ponto de interesse ou, ainda, para manter um regime (normalmente antidemocrático) vigente em determinado Estado e em vias de ser alterado. Trata-se de uma forma extrema de ação política, normalmente ligada a conflitos regionais, em que se busca “o avanço de uma determinada causa e o restabelecimento do equilíbrio perdido no quadro do conflito em que se insere”. Sua principal característica é a imprevisibilidade, que impede que as autoridades estatais e a população civil em geral se defendam dos ataques cometidos”.

De forma geral, a atividade terrorista pode ser definida como atos voltados para a geração de terror, por diversas formas. O terrorismo é tipificado em várias normas internacionais, inclusive na Organização das Nações Unidas, e tem como objetivo evidente a derrubada do regime político vigente, bem como, conforme posição doutrinária, também se caracteriza pela ação imprevisível de seus membros, objetivando a não reação do Estado garantidor da ordem vigente.

O grupo antifascista chamado de antifa ou os antifas, é um movimento de ativistas sem a formação de organização que compartilham princípios e táticas. A palavra antifa, de acordo com o dicionário Merriam-Webster, foi utilizada pela primeira vez em 1946, diante do fim do nazismo após o final da Segunda Guerra Mundial.

 Contudo, nos EUA a expressão começou a ser mais usada nos últimos anos, para destacar os movimentos antifascistas que surgiram após a eleição de Donald Trump, em razão da ascensão da chamada extrema direita. No Brasil o movimento ganha força a partir da eleição de Jair Bolsonaro devido a suas pautas políticas também de extrema direita e sua subserviência aos estadunidenses.

No Brasil, a atuação dos movimentos antifascistas ganhou destaque no último final de semana (31/05/2020),  com a organização de manifestações nas ruas e repudiando as falas e atos fascistas do presidente em exercício, Jair Bolsonaro. Segundo relatos e depoimentos, as ações antifascistas são divulgadas com antecedência e objetivam uma defesa da democracia e dos direitos sociais.  As intervenções antifascistas são realizadas por pessoas das mais variadas orientações políticas dentro do campo de esquerda. 

Portanto, a organização antifa, ou os antifas, não podem ser caracterizados como grupo terrorista, uma vez que a sua luta é a favor do Estado Democrático de Direito, que é a forma do Estado brasileiro, e seu apoio às lutas sociais e ao combate das distintas formas de opressão, como a luta contra a xenofobia, homofobia e racismo.

Ademais, a IDMJR conta com uma valiosa  contribuição do Procurador Geral da República do Ministério Público Federal na Baixada Fluminense, Julio José Araujo Junior, sobre os aspectos constitucionais do PL 3019/2020. 

“O reconhecimento constitucional do crime de terrorismo não pode acarretar uma definição aberta de seu conteúdo. Assim, dado o caráter penal da norma e a gravidade dos atos sobre os quais pretende tratar, a norma sempre deve ser encarada de forma bastante restritiva, que não viole os princípios da dignidade humana, os direitos de reunião e de associação e o pluralismo democrático. 

Nesse sentido, como já destacou a Corte Interamericana no caso Norin Catrimán vs Chile, as leis antiterrorismo não podem servir para criminalizar movimentos sociais ou opositores. Deve, ao contrário, prevalecer a cautela no tratamento do tema, tendo em vista os impactos que a qualificação indevida de um grupo como terrorista gera à própria democracia.

A tentação de enquadrar como terrorista o opositor representa um risco à democracia e à própria valorização das liberdades de expressão e manifestação. É necessário que a ideia de terrorismo, quando aplicada, esteja relacionada a atos bastante claros e definidos de violência grave contra os cidadãos, em razão da pena imposta, das implicações processuais e da própria execução da sanção.

No Brasil, marcado por tantas desigualdades, garantir a reunião, associação, manifestação e protesto se mostra essencial, ainda mais em momentos em que o Estado atua de forma autoritária. Manifestações perturbam, provocam incômodo, mas não devem ser criminalizadas. A própria  Lei nº 13.260/2015 ressaltou, no art. 2º, § 2º, às manifestações políticas e a atuação dos movimentos sociais.”

Além disso, o Procurador Júlio vem fomentando junto com a IDMJR e outras organizações/movimentos sociais da Baixada, a Articulação Pela Vida da População Negra e Periférica da Baixada Fluminense.

Seguimos na defesa dos direitos sociais da população e no enfrentamento de todas as formas de criminalização dos movimentos sociais. Nossos passos vêm de longe e nossa luta segue atuante e contra o Estado violador e fascista. 


Deixe uma resposta