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Por Fransérgio Goulart e Giselle Florentino

Por que boa parte dos moradores/as das favelas continuam indo para as ruas e não respeitando o isolamento social? A Branquitude, no seu lugar histórico de privilégio logo levanta respostas racistas e imediatistas para isso.

“Dessa vez o povo quer morrer, pois o que não falta é informação.” (Postagem no Facebook)

“Pelo amor de Deus, porque essa galera da favela adora festa e continua fazendo churrasco? Não respeitam mesmo o isolamento, absurdo!” (Postagem no Facebook)

Portanto, queremos levantar algumas reflexões:

A arquitetura urbana das favelas – e sempre respeitando as diferenças e especificidades de cada território favelado, foram construídas para levar aos encontros e as trocas. Os becos e vielas representam concretamente como se dá a vida em coletividade, sendo ali que construímos nossas relações de resistências, solidariedade, afetos, conflitos, somos e vivemos no e para o coletivo. 

Logo, completamente diferente das relações sociais dos condomínios dos bairros da Zona Sul que apenas geram e potencializam o individualismo e o isolamento. A favela, por mais que o Capitalismo Racial Brasileiro tente cotidianamente exterminar, na realidade continuamos a existir e nossa sociabilidade é de forma coletivizada, comunitária e solidária. Portanto, completamente avessa ao distanciamento.

Foto de Nathan Josef- Complexo da Manguerinha em Duque de Caxias

Uma outra falácia que é sempre difundida por esse Estado Genocida como argumentação para não garantir condições decentes de vida a população favelada e periférica é a hipótese de que a população deste territórios predominante pretos são fortes e imunes a tudo. 

Por isso, podem aguentar e sobreviver a qualquer advento de letalidade, desde a bala de fuzil saída dos helicópteros utilizados como plataforma de tiros até mesmo a uma pandemia mundial.

A contínua circulação de pessoas nas favelas e nas periferias mesmo sob decretos de quarentena, expõe uma série de fatores sociais que não são tratados pelos grandes especialistas brancos que parecem na mídia hegemônica.

Além da necessidade material da vida, as trabalhadoras e trabalhadores que vivem em favelas e periferias estão na informalidade e sem acesso algum a direitos sociais e nem trabalhistas. Logo, para trazer sustento para sua famílias, o trabalho diário nas ruas é imprescindível. Já que esses postos de trabalho não permitem o home office e nem garantem uma remuneração contínua durante a quarentena.

Toda a mobilização e a ajuda que esses territórios estão recebendo partem dos próprios moradores! A histórica ausência de políticas sociais para essas regiões resultou em processos de ajuda mútua de forma autônoma entre os próprios residentes. E sem essa solidariedade entre os nossos, a situação estaria ainda mais difícil. Nesses momentos de crise social, o Nós por Nós é determinante pra manter a vida do nosso povo.

Há também outros fatores que não são considerados, como  historicamente o Estado Capitalista retirou dessa população o direito de planejar a vida e perspectiva de pensar e sonhar um futuro. 

Afinal, nesses territórios os homicídios fazem parte do cotidiano das pessoas e a vida precisa ser vivida na urgência, como se estivéssemos sempre no último dia de existência. Já que o amanhã não sabemos se estaremos aqui, seja por conta da morte em decorrência de uma Operação Policial, do Covid-19 ou pela fome.

Rápidas reflexões de faveladxs e periféricxs que conseguem ficar em quarentena, mas que não criminaliza seu irmão/ã favelada que não possui a possibilidade de fazer o isolamento social. Tentar compreender, continuar o diálogo e principalmente não acreditar que a educação da repressão resulta em uma mobilização real ao combate no Covid-19. A morte já faz parte do nosso cotidiano. O desafio é como falar de vida, onde a morte já é uma dura regra. 


One thought on “COVID-19 E FAVELAS: PAREM DE NOS CRIMINALIZAR!

  1. Muito se tem dito que uma das consequências dessa pandemia será a instauração de uma nova comportamentalidade humana, que indicará o distanciamento social voluntário. O texto nos revela pistas para duvidar de que essa possibilidade se aplicaria a comunidades que atravessam décadas, desde o.pos-abolição, compartilhando a memória e a vida coletiva como signo de defesa do racismo estrutural.

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